Dos Vícios às Virtudes

Dos Vícios às Virtudes – A Transformação da Humanidade – Antônio Pimentel

4 – A GANÂNCIA COMO NECESSIDADE DE GANHAR MAIS DO QUE O NECESSÁRIO

A ganância, segundo se tem visto nas literaturas, é um sentimento que o ser humano adquire pela vontade de querer para si próprio tudo aquilo à que tem grande admiração. É a vontade exagerada de ter em seu poder qualquer coisa. É o desejo desenfreado de ganhar mais do que precisa, principalmente quando se trata de riqueza material.

A ganância é o mesmo que a ambição sem limites, onde a pessoa deseja alcançar tudo que valoriza, os bens materiais ou o amor próprio, como a riqueza, o poder, a glória, a posição social, entre outros quereres. Dessa forma, o ser humano acometido por esse vício, não hesita em utilizar-se de qualquer meio para alcançar o seu objetivo, obtendo vantagem sobre alguma situação ou de seu próximo.

Na verdade, não há nada de errado quando o ser humano aspira uma vida melhor na busca de seu bem-estar. Isso faz parte do progresso, onde homens, mulheres, famílias ou sociedades almejam melhores condições de sobrevivência, promovendo estruturas familiares, empresariais e sociais, trazendo resultados na evolução humana, como também para o planeta em que habitam.

Quando o homem tiver um conhecimento mais aprofundado de sua verdadeira vida e perceber o grande objetivo de sua estada na Terra, que é o aprendizado que pode alcançar por meio das experiências na vida corpórea, não mais se utilizará da ganância, que tem como consequência a ambição de ganho ou a ambição desmedida.

Chegará o momento onde a humanidade compreenderá que o bem-estar de cada pessoa deverá acontecer de maneira natural, sem prejuízo de ninguém, e que tudo o que for conquistado será o resultado direto de seu trabalho.

Na Bíblia encontramos muitas descrições sobre a ganância. No Novo Testamento, em Lucas, capítulo 12, versículos 13 a 21, quando Jesus falava a uma multidão, disse-lhe alguém dentro do povo: “Mestre, dize a meu irmão que reparta comigo a herança”. Jesus lhe respondeu: “Moço, quem me colocou como juiz ou partidor entre vós?” E lhes disse em seguida: “Cuidado com qualquer tipo de cobiça, porque mesmo que se tenha muito, a vida não está no que se possui”.

Contou-lhes então uma parábola mostrando que havia um homem rico, cujas terras lhe deram grande colheita. Ele pensava consigo mesmo: “O que vou fazer? Não tenho onde guardar a colheita!”. Disse então: “Já sei o que vou fazer; vou derrubar os celeiros e construir maiores para ali guardar todo o trigo e os meus bens. Então poderei dizer a mim mesmo: ‘Meu caro tens muitos bens armazenados para muitos anos. Descansa, come, bebe, festeja’”. Deus, porém, lhe disse: “Insensato! Ainda nesta mesma noite tirarão a tua vida, e para quem ficará tudo que acumulastes?”. Concluiu então Jesus dizendo à multidão que isso é o que acontece com quem ajunta tesouros para si e não é rico diante de Deus.

Em Mateus, capítulo 6, versículos 19 a 24, percorrendo Jesus toda a Galileia, em determinado local, subiu ao monte e falou à multidão que o circundava, entre outros ensinamentos, sobre a busca à verdadeira riqueza. Disse ele: “Não ajunteis riquezas na Terra, onde a traça e a ferrugem as corroem e os ladrões assaltam e roubam. Ajuntai riquezas no céu, onde nem traça nem ferrugem as corrói, onde os ladrões não arrombam nem roubam. Pois onde estiver vosso tesouro, aí também estará o coração”.

“O olho é a lâmpada do corpo. Se o teu olho for sadio, todo o corpo ficará iluminado. Mas se teu olho estiver doente, todo o corpo ficará na escuridão. Pois, se a luz que está em ti for escuridão, como não será a escuridão?”.

“Ninguém pode servir a dois senhores. Pois ou odiará um e amará o outro, ou será fiel a um e abandonará o outro. Não podeis servir a Deus e às riquezas.”.

Allan Kardec no livro “Evangelho Segundo o Espiritismo”, capítulo XVI, item 7, ao dissertar sobre a utilidade providencial da riqueza, descreveu que se esta fosse um obstáculo absoluto à salvação daqueles que a possuem, como se poderia inferir de certas palavras de Jesus, interpretadas segundo a letra que não pelo espírito, Deus, que a concede, teria posto nas mãos de alguns homens um instrumento de perdição, sem vantagens – o que repugna à razão admitir.

Diz Allan Kardec em continuidade ao assunto que, sem dúvida, a riqueza é uma prova bem arriscada, muito mais perigosa do que a miséria, pelos seus arrastamentos, pela tentação que provoca e pela fascinação que exerce. Supremo excitante do orgulho, do egoísmo e da luxúria, é o mais poderoso laço que liga o homem a Terra e lhe desvia o pensamento do céu. Produz tal vertigem que se vê muitas vezes aquele que passou da miséria à fortuna esquecer rapidamente a sua primitiva posição e aqueles que o auxiliaram, tornando-se insensível, egoísta e fútil. Mas porque torna difícil o caminho, não se segue que o deixe intransponível e não se converta em um meio de salvamento nas mãos de quem saiba servir-se dela, como certos venenos podem restituir a saúde quando empregados com discernimento.

No mesmo capítulo, item 8, Allan Kardec fala da desigualdade das riquezas, esclarecendo que ela é um dos problemas que em vão se procura resolver, ao considerar-se apenas a vida atual. A primeira questão que se oferece é a seguinte: por que motivo não são todos os homens igualmente ricos? Não o são pelo fato muito simples de não serem igualmente inteligentes, ativos e laboriosos para a adquirirem, nem sóbrios e previdentes para a conservarem.

Diz ainda que, ademais, está matematicamente demonstrando que a fortuna igualmente repartida daria a cada pessoa bem pequena e insuficiente parcela; que, feita essa divisão, seria desfeito o equilíbrio econômico em pouco tempo pela diversidade de caracteres e aptidões que, supondo-se que fosse possível e duradoura, cada qual, tendo com que viver, ocasionaria o aniquilamento dos grandes trabalhos concernentes ao progresso e bem-estar da humanidade; que, suposto desse ela a cada um o necessário, não haveria mais o aguilhão que impulsiona as grandes descobertas e empreendimentos úteis. Se Deus a concentra em certo número de pessoas é para aí espalhar-se em suficiente quantidade, conforme as necessidades.

A partir dos esclarecimentos de Allan Kardec pode se chegar ao entendimento da verdadeira propriedade, quando o espírito de Pascal, dando as suas instruções, descreveu que o homem não possui de próprio senão o que pode levar desse mundo. O que ele acha ao chegar e deixa quando parte, só pode gozar durante a sua estada aqui. Mas, desde que é forçado a abandonar a coisa, cabe-lhe apenas o seu usufruto e não a posse real. Que deve então possuir? Nada do que somente seja prestável ao corpo e sim tudo quanto aproveite à alma – inteligência, os conhecimentos, as qualidades morais. Eis aí o que ele traz e torna a levar o que ninguém lhe poderá subtrair e há de servir-lhe mais no outro mundo do que neste. Dele depende ser mais rico na partida que na chegada, visto que, do que houver adquirido em benefícios, depende a sua futura posição. Quando um homem vai para longínquas terras, arruma as suas bagagens e os objetos que tenham utilidade nesse lugar, deixando de carregar os que julguem inúteis. Que os homens desta terra façam o mesmo quanto à vida futura, aprovisionando-se do que nela lhes possa servir.

Tomamos conhecimento de um fato curioso ocorrido em uma determinada casa espírita, onde, na ocasião, estava acontecendo uma reunião mediúnica, e, contrariando os procedimentos habituais da equipe de médiuns, manifestou-se um espírito em um médium e, logo a seguir, outro espírito fez o mesmo em um médium que estava ao lado, dando início a um grande falatório, com trocas de acusações.

Apesar de inusitada, a discussão acontecia com o consentimento e a supervisão do orientador espiritual do grupo. Todos os participantes se colocaram diante do fato, de acordo com a exigência da situação, deixando ao dirigente da reunião a incumbência de intermediar o desentendimento que tinha relação com uma caixa que supostamente continha valores que cada um dos opositores reclamava para si, acusando o outro de furto.

A conversação entre os dois prosseguiu por alguns minutos enquanto o dirigente tomava conhecimento dos detalhes desse diálogo pouco amigável, passando a ter maiores informações do assunto por meio da intuição que teve dos mentores espirituais. Num certo momento, o dirigente intervindo na conversa, pediu-lhes que ficassem em silêncio em respeito ao local em que estavam, como também às pessoas presentes. Solicitou então que os dois se explicassem com mais calma. Após, o dirigente recebeu a orientação dos mentores espirituais para “confiscar” provisoriamente a tal caixa, informando aos dois sobre esse procedimento, até que fosse apurado a quem de fato pertenciam os valores que estavam no objeto.

Num ímpeto de reflexão, os dois espíritos envolvidos aceitaram o suposto confisco, dando oportunidade a repensar sobre a sua própria situação. O dirigente recomendou-lhes que olhassem à sua volta e ouvissem com atenção o que era dito pelos participantes da reunião mediúnica, como também que procurassem reconhecer o ambiente em que se encontravam e, finalmente, descrevessem tudo o que podiam perceber. Feito isto, os dois mencionaram que o ambiente, antes nublado para eles, iluminava-se um pouco mais, tendo o dirigente pedido que prestassem atenção porque pessoas amigas, já desencarnadas, aproximaram-se deles para falar-lhes. Com isso, tiveram a certeza de que não viviam mais na matéria, percebendo a sua condição de desencarnados, sendo o desentendimento entre eles superado.

Ao final do processo, o dirigente perguntou-lhes se queriam a caixa de volta. Olhando para um ponto fora dos olhos do dirigente, perguntaram: “Por que a caixa se transformou em um amontoado de lama?”. Foi explicado pelo dirigente que se tratava de uma fixação mental na qual ambos alimentaram-se por longo tempo na disputa da riqueza que tinha ficado na Terra. Constrangidos, agradeceram e despediram-se do dirigente e de todo o grupo, sendo encaminhados para a companhia de enfermeiros espirituais que os conduziram a locais de recuperação e esclarecimento de que tanto tinham necessidade.

A ganância, ou seja, a ambição desmedida, gera a cobiça pelos valores materiais, trazendo, na maioria das vezes, o desentendimento entre as pessoas, e na verdade, o homem pode ser enganado pelo desejo que possui, trazendo muitas vezes atribulações, seja pelo poder ou pela riqueza descontrolada. É preciso que haja equilíbrio em tudo na vida, tendo ciência de que mais cedo ou mais tarde o homem passa pelo fenômeno da morte. Daí a importância do desapego aos bens materiais, sejam objetos ou valores, lembrando sempre que o que é da Terra fica na terra, e que a vida terrena é transitória. O que se leva é o que se aprende, que de preferência devem ser as coisas boas.